Steve Albini, o maestro sonoro, deixa legado aos 61 anos

Steve Albini em ação com a Big Black em Seattle, 1987 (Foto: Charles Peterson)

Em 8 de maio de 2024, o mundo da música ficou em choque com a notícia devastadora da morte do maestro sonoro que marcou uma geração. Steve Albini, morreu aos 61 anos, vítima de um ataque cardíaco no dia anterior em sua casa. Albini deixa um legado que impactou gerações, sendo parte de álbuns e bandas que marcaram uma época.

Além de engenheiro de áudio, produtor e jornalista musical, era também um músico multi-instrumentista, cantor e compositor conhecido e respeitado no cenário underground, com seus projetos brilhantes (Big Black, Rapeman e Shellac), que influenciaram e seguem influenciando diversas gerações.

É inegável a contribuição que o californiano, notoriamente (e preferido por si mesmo) conhecido por ser um espetacular engenheiro de som, fez pelo cenário independente mundial com suas habilidades de captar de maneira analógica com fidelidade todas as bandas que passaram por suas mãos. Separamos alguns dos trabalhos que passaram por suas mãos, ou melhor dizendo, ouvidos, que valem a pena mencionar, sendo nossa humilde e sincera homenagem a esse gigante da música:

Pixies (Foto: Divulgação)

Surfer Rosa, o álbum de estreia dos Pixies, lançado em 1988, certamente é um dos álbuns mais influentes no mundo do rock alternativo. Intitulado por alguns como pais do indie rock a partir desse momento, Albini foi quem captou esse momento simbólico na música, que influenciou nomes como David Bowie, Nirvana, Smashing Pumpkins, entre outros. Albini usou truques de gravação que fazem desse disco ser algo singular, como passar os vocais de Francis através de pedais de distorção, gravar o vocal de Kim Deal no banheiro em Gigantic, pedir aos dois guitarristas para usarem palhetas de metal, e por aí vai.

Superchunk (Foto: Divulgação)

Na gravação do segundo álbum do maravilhoso quarteto Superchunk, No Pocky for Kitty, lançado em 1991, foi com Albini que “mudou nossa banda e nossas vidas” declara Mac McCaughan, vocalista e guitarrista do grupo. A banda conheceu Albini em Chapel Hill no ano de 1990, num show do Sonic Youth, e Albini estava fazendo o som para a banda de abertura: Jesus Lizard. A Superchunk viu que a turnê levaria o grupo por Chicago, onde Albini tinha um contrato noturno em andamento com a Chicago Recording Company, “então pedimos ao (co-fundador da Matador Records) Gerard (Cosloy) que nos colocasse em contato. Estávamos entusiasmados com a ideia de que Steve faria isso e que ele tinha um plano que poderíamos pagar. Ficamos intimidados, mas também estávamos acostumados a gravar rápido. E sabíamos que ele pretendia capturar uma banda de forma realista, que se encaixasse com a nossa estética naquele momento”, comenta McCaughan, que segundo ele, foram 3 noites gravando e mixando das 18h às 6h. Mac complementa dizendo que “musicalmente, Steve mostrou como cortar gordura (ou seja, harmonias e solos de guitarra) e trabalhar rápido, mas ele também nos fez soar enormes, muito maiores do que éramos na vida real.”

Já o Nirvana, em 1993, mesmo contra gosto de sua gravadora, Kurt Cobain e sua trupe optaram por gravar In Utero com Albini, e a história já sabemos por si só. In Utero não somente é considerado uma obra prima, e por muitos o ápice do grupo, mas ficou marcado por ser feito em primeiras tomadas e da maneira que a banda queria ser captada, sem grandes produções por detrás. Embora a gravadora Geffen Records na época tenha sido contra os métodos adotados pelo grupo dizendo não ser “um produto vendável”, ali podemos ver a essência de um grupo brilhante, que evidentemente foi captado de maneira primorosa por Albini. 20 anos após seu lançamento, Dave Grohl e Krist Novoselic finalmente puderam lançar a versão de Albini:

Rid Of Me, lançado também em 1993, por PJ Harvey, é uma prova viva de que Albini sabia o que estava fazendo em matéria de captar a alma do artista. PJ Harvey mesmo disse:  “Eu sabia que queria trabalhar com Steve Albini ouvindo os discos do Pixies e ouvindo os sons que ele estava obtendo, que eram diferentes de qualquer outro som que eu tinha ouvido em vinil.”

PJ Harvey (Foto: Divulgação)

“Eu realmente queria aquele som muito simples e real. Eu sabia que isso combinaria com as músicas. É como tocar objetos reais ou sentir a textura da madeira.” PJ Harvey sobre a captação de Steve Albini em Rid Of Me, em 93.

Tim Kinsella (Foto: Divulgação)

Tim Kinsella (Cap’n Jazz, Make Believe, Joan of Arc, Everyoned, Friend/Enemy) quando se reuniu com seus parceiros de Cap’n Jazz para fazer o primeiro e surpreendente álbum da Owls, listado entre um dos discos mais importantes e influentes da cena indie emo, não hesitou em dizer e enfatizar a importância crucial de Steve Albini para registrar esse momento: “Se vamos fazer isso, gravar em fita, gravar tudo ao vivo – precisa ser Albini”.

Para as meninas do Breeders, em seu álbum debut,  Steve Albini teve papel fundamental no processo de construção do álbum, lidando com egos e conflitos internos, como por exemplo convencer Tanya Donelly, uma das guitarras, que o take gravado por ela estava ótimo, mesmo contra sua vontade, que no dia seguinte estaria convencida que era o melhor mesmo.  Albini trabalhou com o grupo a ideia de reduzir o número de harmonias vocais e dar mais ênfase aos vocais de Kim Deal, trazendo uma atmosfera mais densa para o álbum. Em POD vemos a estreia de um super grupo que nos anos seguintes explodiria comercialmente com seu álbum Last Splash, lançado em 1993, porém POD figura entre os melhores discos do rock alternativo já lançados. Gravado em 1 (uma) semana em terras escocesas, que contava com equipamento de gravação no primeiro andar e quartos no andar de cima, que durante algumas sessões curiosamente as meninas ainda em pijamas desciam pra gravar, e até iam ao pub que ficava ao lado sem se trocar.

Tad Doyle (Foto: Divulgação)

Salt Lick, lançado pela Sub Pop em 1990, dos furiosos e grunges TAD possui faixas potentes e clássicas como High On The Hog, Wood Gooblins (aquela mesma do clipe que era feio demais para passar na MTV) e Loser, figuram nesse EP sônico e brutal para uma época em que tudo era glam. Tad Doyle comenta:

Aprendi muito com esses caras. Mas, em retrospecto, gostaria de fazer muito mais perguntas como “O que você está usando aqui? Por que você está usando este microfone?” Que tipo de técnicas de compressão você está usando? Por que estamos aqui? Por que você prefere usar este amplificador?”

Capa do álbum 24 Hour Revenge Therapy (Imagem: Reprodução)

O terceiro álbum da banda Jawbreaker, 24 Hour Revenge Therapy, um clássico do emo punk, também passou pelas mãos de Albini, que tinha fama de não querer levar crédito pelos seus trabalhos, e numa brincadeira, a banda acabou creditando como engenheiro de som o gato de Steve Albini, chamado Fluss. Em entrevista a uma revista, o baixista Chris Bauermeister conta que de todas gravações da banda, ele gosta mais do álbum 24 Hour porque soa como se a banda estivesse ao vivo, que foi basicamente gravado assim, no porão da casa de Albini.

São muitos discos, e precisaríamos de muitas páginas para falar de Steve Albini, que era conhecido por ser muitas vezes rabugento porém um cara simpático e doce, que tentava deixar o ambiente de gravação o mais cômodo possível. Sentiremos sua falta, mestre.

Rest in Sound, Steve.

(Zine Musical)

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